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Existirmos, a que será que se destina?" - pergunta um verso de Caetano Veloso em sua bela canção “Cajuína", nascida numa visita a amigo em Teresina. Que faz numa canção popular essa pergunta fundamental sobre o propósito mesmo da vida humana? - perguntarão aqueles que preferem separar bem as coisas, julgando que somente os gêneros “sérios" podem querer dar conta das questões “sérias". O preconceito está em não admitir que haja inteligência - e das fulgurantes, como a de Caetano Veloso - entre artistas populares. O fato é que a pergunta dessa canção, tão sintética e pungente, incide sobre o primeiro dos nossos enigmas: o da finalidade da nossa existência.
Não seria difícil encontrarmos em nosso cancioneiro exemplos outros de pontos de reflexão essencial sobre nossa condição no mundo. Em “A vida é um moinho", de Cartola, ou em “Esses moços", de Lupicínio Rodrigues, ou ainda em “Juízo final", de Nelson Cavaquinho, há agudos lampejos reflexivos, nascidos de experiências curtidas e assimiladas. Não se trata de “sabedoria popular": é sabedoria mesmo, sem adjetivo, filtrada por espíritos sensíveis que encontraram na canção os meios para decantar a maturidade de suas emoções. Até mesmo numa marchinha de carnaval, como “A jardineira", do Braguinha, perguntamos: “Ó jardineira, por que estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu?" - para saber que a tristeza dela vem da morte de uma camélia. Essa pequena tragédia, cantada enquanto se dança, mistura-se à alegria de todos e funde no canto da vida o advento natural da morte: “Foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros e depois morreu..."
Mesmo em nosso folclore, compositores anônimos alcançaram um tom elevado na dicção aparentemente ingênua de uma cantiga de roda. Enquanto se brinca, canta-se: “Menina, minha menina / Faz favor de entrar na roda / Cante um verso bem bonito / Diga adeus e vá-se embora". Não será essa uma expressão justa do sentido mesmo de nossa vida: entrar na roda, dizer a que veio e ir-se embora? É o que cantam as alegres crianças de mãos dadas, muito antes de se preocuparem com a metafísica ou o destino da humanidade.
(BARROSO, Silvino, inédito)
O sentido essencial desse texto, considerado no conjunto e na perspectiva adotada pelo autor, está adequadamente expresso na seguinte formulação:
A)
é da natureza mesma da arte popular expressar, em linguagem rebuscada e hermética, os temas que perturbam os filósofos e costumam ecoar nos seus mais altos tratados.
B)
a canção popular encontra a justificativa mesma da sua existência no fato de responder em linguagem altissonante as questões que costumam afligir nossas vidas.
C)
muitas vezes ocorre que se encontre numa canção popular a expressão de uma grande sabedoria, nascida e decantada a partir de uma funda experiência.
D)
os artistas populares habilitados a tratar dos mais profundos temas em suas canções não deixam de acusar a formação acadêmica que lhes dá respaldo.
E)
a sabedoria popular dispensa esse adjetivo toda vez que surpreendemos, na letra de uma canção, uma versão facilitada dos clássicos e folclóricos ditados.
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Existirmos, a que será que se destina?" - pergunta um verso de Caetano Veloso em sua bela canção “Cajuína", nascida numa visita a amigo em Teresina. Que faz numa canção popular essa pergunta fundamental sobre o propósito mesmo da vida humana? - perguntarão aqueles que preferem separar bem as coisas, julgando que somente os gêneros “sérios" podem querer dar conta das questões “sérias". O preconceito está em não admitir que haja inteligência - e das fulgurantes, como a de Caetano Veloso - entre artistas populares. O fato é que a pergunta dessa canção, tão sintética e pungente, incide sobre o primeiro dos nossos enigmas: o da finalidade da nossa existência.
Não seria difícil encontrarmos em nosso cancioneiro exemplos outros de pontos de reflexão essencial sobre nossa condição no mundo. Em “A vida é um moinho", de Cartola, ou em “Esses moços", de Lupicínio Rodrigues, ou ainda em “Juízo final", de Nelson Cavaquinho, há agudos lampejos reflexivos, nascidos de experiências curtidas e assimiladas. Não se trata de “sabedoria popular": é sabedoria mesmo, sem adjetivo, filtrada por espíritos sensíveis que encontraram na canção os meios para decantar a maturidade de suas emoções. Até mesmo numa marchinha de carnaval, como “A jardineira", do Braguinha, perguntamos: “Ó jardineira, por que estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu?" - para saber que a tristeza dela vem da morte de uma camélia. Essa pequena tragédia, cantada enquanto se dança, mistura-se à alegria de todos e funde no canto da vida o advento natural da morte: “Foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros e depois morreu..."
Mesmo em nosso folclore, compositores anônimos alcançaram um tom elevado na dicção aparentemente ingênua de uma cantiga de roda. Enquanto se brinca, canta-se: “Menina, minha menina / Faz favor de entrar na roda / Cante um verso bem bonito / Diga adeus e vá-se embora". Não será essa uma expressão justa do sentido mesmo de nossa vida: entrar na roda, dizer a que veio e ir-se embora? É o que cantam as alegres crianças de mãos dadas, muito antes de se preocuparem com a metafísica ou o destino da humanidade.
(BARROSO, Silvino, inédito)
Atente para as seguintes afirmações:
I. No primeiro parágrafo, o autor estranha a presença de uma reflexão tão aguda, em tom conclusivo, na letra de compositor popular, que melhor faria se viesse a dar voz a questões menos complexas.
II. No segundo parágrafo, os exemplos de canções elencados pelo autor do texto servem-lhe como argumento para contestar a relevância do questionamento expresso no verso de Caetano Veloso, citado no parágrafo anterior.
III. No terceiro parágrafo, os versos de uma conhecida cantiga de roda são lembrados como exemplo do alcance trágico que se pode reconhecer nas palavras que as crianças cantam enquanto brincam.
Em relação ao texto, está correto o que se afirma em
A)
I, II e III.
B)
I e II, apenas.
C)
II e III, apenas.
D)
I e III, apenas.
E)
III, apenas.
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Não seria difícil encontrarmos em nosso cancioneiro exemplos outros de pontos de reflexão essencial sobre nossa condição no mundo. Em “A vida é um moinho", de Cartola, ou em “Esses moços", de Lupicínio Rodrigues, ou ainda em “Juízo final", de Nelson Cavaquinho, há agudos lampejos reflexivos, nascidos de experiências curtidas e assimiladas. Não se trata de “sabedoria popular": é sabedoria mesmo, sem adjetivo, filtrada por espíritos sensíveis que encontraram na canção os meios para decantar a maturidade de suas emoções. Até mesmo numa marchinha de carnaval, como “A jardineira", do Braguinha, perguntamos: “Ó jardineira, por que estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu?" - para saber que a tristeza dela vem da morte de uma camélia. Essa pequena tragédia, cantada enquanto se dança, mistura-se à alegria de todos e funde no canto da vida o advento natural da morte: “Foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros e depois morreu..."
Mesmo em nosso folclore, compositores anônimos alcançaram um tom elevado na dicção aparentemente ingênua de uma cantiga de roda. Enquanto se brinca, canta-se: “Menina, minha menina / Faz favor de entrar na roda / Cante um verso bem bonito / Diga adeus e vá-se embora". Não será essa uma expressão justa do sentido mesmo de nossa vida: entrar na roda, dizer a que veio e ir-se embora? É o que cantam as alegres crianças de mãos dadas, muito antes de se preocuparem com a metafísica ou o destino da humanidade.
(BARROSO, Silvino, inédito)
Considerando-se o contexto, traduz-se adequadamente o sentido de um segmento em:
A)
o preconceito está em não admitir
(1º parágrafo) = a razão alegada leva à inclusão
B)
agudos lampejos reflexivos
(2º parágrafo) = súbitas e cortantes reflexões
C)
experiências curtidas e assimiladas
(2º parágrafo) = vivências prazerosas e alienadas.
D)
filtrada por espíritos sensíveis
(2º parágrafo) = purificada por mentes pragmáticas
E)
dicção aparentemente ingênua
(3º parágrafo) = pronúncia supostamente engenhosa
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Não seria difícil encontrarmos em nosso cancioneiro exemplos outros de pontos de reflexão essencial sobre nossa condição no mundo. Em “A vida é um moinho", de Cartola, ou em “Esses moços", de Lupicínio Rodrigues, ou ainda em “Juízo final", de Nelson Cavaquinho, há agudos lampejos reflexivos, nascidos de experiências curtidas e assimiladas. Não se trata de “sabedoria popular": é sabedoria mesmo, sem adjetivo, filtrada por espíritos sensíveis que encontraram na canção os meios para decantar a maturidade de suas emoções. Até mesmo numa marchinha de carnaval, como “A jardineira", do Braguinha, perguntamos: “Ó jardineira, por que estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu?" - para saber que a tristeza dela vem da morte de uma camélia. Essa pequena tragédia, cantada enquanto se dança, mistura-se à alegria de todos e funde no canto da vida o advento natural da morte: “Foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros e depois morreu..."
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(BARROSO, Silvino, inédito)
Um dos recursos expressivos utilizados no texto consiste em
A)
repetir palavras com a finalidade de reforçar a qualificação de um mesmo objeto, como em:
somente os gêneros “sérios” podem querer dar conta das questões “sérias”.
B)
repetir o sinal de aspas para indicar o emprego inadequado de um vocábulo, como em “Esses moços” ou em “Juízo final”.
C)
aproximar expressões de sentido radicalmente antagônico, como ocorre entre
se preocuparem com a metafísica e o destino da humanidade.
D)
empregar a primeira pessoa do plural em pronomes e formas verbais, para incluir o leitor no discurso, como em:
Não seria difícil encontrarmos em nosso cancioneiro exemplos outros de pontos de reflexão essencial sobre nossa condição no mundo
.
E)
estabelecer clara oposição de sentido entre expressões de uma mesma frase, como ocorre entre
alcançaram um tom elevado e uma expressão justa do sentido mesmo de nossa vida.
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Está clara e correta a
redação
deste livre comentário sobre o texto.
A)
Há muito preconceito, pondera o autor, na manifestação de juízos quanto ao alcance artístico e ao papel social que se reservam às canções populares.
B)
O cancioneiro popular é com frequência vítima de preconceitos, segundo o qual lhes cabe apenas deter-se nos limites já lhe consignados.
C)
É comum e preconceituoso o entendimento de que o compositor popular, atendo-se à uma função que lhe é própria, não se arvore em temas de maior envergadura.
D)
O conceito mesmo de inadequação não se aplicaria à arte, mesmo popular, quando esta se dispor a vencer barreiras em prol de maior seriedade.
E)
Frequentemente surge o preconceito que o compositor popular, uma vez despreparado para os altos temas, deveria aboná-los à favor de sua própria arte.
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