01 Os garotos da Rua Noel Rosa onde um talo de samba viça no calçamento, viram o pombo-correio cansado04 confuso aproximar-se em voo baixo.
Tão baixo voava: mais raso07 que os sonhos municipais de cada um. Seria o Exército em manobras ou simplesmente10 trazia recados de ai! amor à namorada do tenente em Aldeia Campista?
E voando e baixando entrançou-se13 entre folhas e galhos de fícus: era um papagaio de papel, estrelinha presa, suspiro16 metade ainda no peito, outra metade no ar.
Antes que o ferissem,19 pois o carinho dos pequenos ainda é mais desastrado que o dos homens e o dos homens costuma ser mortal22 uma senhora o salva tomando-o no berço das mãos e brandamente alisa-lhe25 a medrosa plumagem azulcinza cinza de fundos neutros de Mondrian azul de abril pensando maio.
28 283235-58-Brasil dizia o anel na perninha direita. Mensagem não havia nenhuma31 ou a perdera o mensageiro como se perdem os maiores segredos de Estado que graças a isto se tornam invioláveis,34 ou o grito de paixão abafado pela buzina dos ônibus. Como o correio (às vezes) esquece cartas37 teria o pombo esquecido a razão de seu voo?
Ou sua razão seria apenas voar40 baixinho sem mensagem como a gente vai todos os dias à cidade e somente algum minuto em cada vida43 se sente repleto de eternidade, ansioso por transmitir a outros sua fortuna?
Era um pombo assustado46 perdido e há perguntas na Rua Noel Rosa e em toda parte sem resposta.
49 Pelo quê a senhora o confiou ao senhor Manuel Duarte, que passava para ser devolvido com urgência52 ao destino dos pombos militares que não é um destino.
Carlos Drummond de Andrade. Pombo-correio. In: Carlos Drummond de Andrade: obra completa. Rio de Janeiro: NovaAguilar, 2002, p. 483. Internet: <www.releituras.com>.
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